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'Pega tudo que o senhor tem, põe no altar, pra Deus te abençoar', pediu pastor da IURD a padeiro que vendeu padaria para doar dinheiro

Igreja Universal do Reino de Deus foi condenada a indenizar o homem em R$ 30 mil.

Por Neuza em 31/03/2025 às 16:42

'Pega tudo que o senhor tem, põe no altar, pra Deus te abençoar', pediu pastor da IURD a padeiro que vendeu padaria para doar dinheiro

Caso ocorreu na Igreja Universal no bairro Santo Amaro, em Recife (PE) - Foto: Reprodução/Portal Igreja Universal do Reino de Deus

Transcrições de áudios enviados no WhatsApp por um pastor da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) revelam os pedidos realizados em nome da igreja para que um padeiro de Olinda (PE) doasse todos os seus bens, incluindo o dinheiro da venda de sua padaria. Por causa do que a Justiça entendeu como "má-fe", a IURD foi condenada pela 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) a indenizar o homem em R$ 30 mil. A igreja recorrerá da decisão.

Nas conversas, às quais o Terra obteve acesso nesta segunda-feira, 31, o pastor Rodrigo Antônio, da Igreja Universal do bairro Santo Amaro, Centro do Recife, questiona o fato do padeiro ter dado uma quantia em dinheiro à sua própria companheira. "O senhor não tem que dar nada não. Não cai nessa não. Isso é o diabo."

"Pega o valor, pega tudo que o senhor tem, põe no altar, no sacrifício, pra Deus te abençoar. Não dá nada. O senhor não tem que dar R$ 5 mil pra essa mulher. O senhor não tem que dar R$ 10 mil pra mãe dela. Não!", afirma o pastor, que ainda questiona se o padeiro é "casado no papel". "Eu acho que nem no papel o senhor é casado, o senhor não deveria ter dano nada pra ela."

Fiel desde março de 2017, o padeiro passou a frequentar semanalmente o templo religioso, onde conheceu o pastor Rodrigo Antônio. Ao comparecer à igreja, ele entregava de oferta valores entre R$ 20 e R$ 200. Em mês de novembro daquele ano, disse ao pastor que iria fechar a padaria que possuía, vender tudo o que tinha e entregar à igreja o valor de R$ 40 mil. Na ocasião, o líder religioso afirmou que, caso cumprisse a promessa, teria uma mudança positiva de vida a partir de janeiro de 2018. Desde então, o pastor passou a tentar convencer o padeiro a realizar a doação. 

"Agora é hora de sacrificar. Sacrifício não é só os R$ 30 mil, é toda vida do senhor. Entendeu? O senhor já se batizou, agora é o senhor pegar e levantar, e preparar o seu sacrifício, esse valor de R$ 30 mil, e tudo que vier na mão do senhor, tudo que vier. Se tiver mais coisas que o senhor pegue e fale assim: ah, vou vender, vou pegar esse dinheiro e vou botar no envelope. O senhor tá cansado dessa vida. (...) O senhor rejeitou o altar! O senhor não colocou toda força no altar", declarou.

Depois de não ver sua vida melhorar, com aluguéis atrasados, endividado com a escola onde sua filha estudava e sem a padaria que lhe dava sustento, o padeiro voltou a procurar o pastor, que o mandou "correr atrás" de trabalho. 

No entendimento da Justiça, o pastor usou sua influência sobre o padeiro para induzi-lo a doar a quantia e ainda vender bens sob a promessa de bênçãos divinas e o temor de que sua vida pioraria caso não realizasse a oferta. O TJPE fala em exploração da fé e da vulnerabilidade emocional do fiel, e em exceder limites da liberdade religiosa e abuso de poder e má-fé, e ainda afirma haver um "padrão de conduta" dos pastores da IURD para conseguir doações. 

Após a condenação, a IURD reclamou de cerceamento de defesa, devido ao indeferimento de uma suposta prova testemunhal que comprovaria a validade das doações. A igreja alegou que a decisão viola dispositivos do Código Civil, do Código de Processo Civil e da Constituição, ao considerar ilícita a prática de exortação de ofertas, que seria inerente à sua atividade. Além disso, a IURD argumentou que não houve coação, mas sim doação voluntária, que o fiel aderiu livremente à doutrina, e que a sentença desconsidera a liberdade religiosa e a separação entre Estado e religião.

Leia abaixo a nota da IURD na íntegra:

Nenhuma igreja ou instituição assistencialista que depende de doações voluntárias poderia existir se a lei não a protegesse de supostos “doadores arrependidos”. Justamente por essa razão, a Constituição Federal (p.e.: art. 5º, II, IX, XVII e XXXVI) e o Código Civil (p.e.: art. 538 da Lei nº 10.406) têm normas claras que garantem a liberdade de pedir doações, bem como de fazê-las.

Vale ressaltar, também, que o autor desta ação é uma pessoa esclarecida e totalmente apta e capaz de assumir suas próprias decisões, sendo conhecedor dos rituais litúrgicos — até porque, já havia realizado ofertas voluntárias em outros momentos — ao longo do período em que frequentou a Igreja.

Dito isso, a Igreja Universal do Reino de Deus reitera que, em um país laico, como o Brasil, é vedado qualquer tipo de intervenção do Estado — incluindo, do Poder Judiciário — na relação de um fiel com a sua igreja (p.e.: CF, art. 19, I; art. 5º, VI). E, por fim, informa que a Instituição não teve chance de produzir provas para contrapor o autor da ação em primeira instância. Exatamente por isso, apelou ao Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco.

Totalmente convicta de que a Justiça e a verdade prevalecerão, a Igreja recorrerá.

Fonte: Terra

Tags:   Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) Pastor má-fé
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