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Vergonha - Brasil: 60 mil morreram em hospício e corpos eram vendidos para universidades gerando R$ 600 mil

Por Neuza em 03/12/2018 às 08:34

Luiz Alfredo, um fotógrafo da extinta revista O Cruzeiro, registrou as imagens em 1961 que você verá aqui nesta reportagem. Elas, bem como relatos chocantes, estão no livro chamado Holocausto Brasileiro – da editora Geração Editorial, da autora Daniela Arbex.

 

A publicação, lançada em 2013, mostra a barbárie ocorrida aqui no Brasil com traços de campos de concentração nazista. O cenário de horror é o manicômio da cidade mineira de Barbacena. Estima-se que pelo menos 60 mil pessoas morreram entre os anos de 1903 e 1980. Mais chocante que isso só o fato de que os corpos eram vendidos e geraram lucro para a instituição.

A tragédia esquecida, foi ocultada da grande maioria dos brasileiros. Motivado por este fato, a jornalista Daniela Arbex se questionou sobre os motivos da geração dela não saber de um ato tão terrível ocorrido aqui, em terras brasileiras. O local era apelidado de Colônia, justamente por possuir traços de comportamento da Alemanha Nazista que dizimou milhares de vidas na Segunda Guerra Mundial, encabeçado pelo ditador Adolf Hitler.


O nome do livro foi inspirado pelas reais condições que as pessoas eram tratadas. Muitas chegavam em massa, em vagões de carga até o manicômio, semelhante forma usada pelos nazistas para transportar os judeus. Os homens, em especial, tinham suas cabeças raspadas, a maioria ficava nu, e somente depois usavam uniformes padronizados – mas nem todos.

 

O psiquiatra Franco Basaglia, italiano, em 1979 relatou que visitou o hospício em uma busca solitária de amenizar ou reverter os graves acontecimentos que ocorriam na Colônia – sem sucesso.

 

Capa do livro Holocausto Brasileiro. Foto: Divulgação

Incrivelmente, o passado parece ter sido deixado em uma gaveta guardada a sete chaves, tanto é que a instituição ainda existe nos dias de hoje. Sendo inaugurada em 1903, sempre foi alvo de controvérsias sobre o tratamento prestado, mas entre os períodos de 1930 e 1980 houve o ápice de maior crueldade humana. Nesta faixa de tempo, pessoas que não possuíam nenhum problema mental eram internadas – algo estimado em 70% das pessoas não tinha diagnósticos psiquiátricos e não deveriam estar ali.

 

Em 1930 era como se a ética médica e os critérios de avaliação estivessem desaparecidos no tempo e na dignidade de cada ser que ali vivia. Com a chegada da Ditatura Militar no Brasil em 1969, os horrores praticados foram completamente abafados.


Em entrevistas à imprensa, o psiquiatra Franco Basaglia comentou que entre 1930 a 1980, o manicômio tornou-se um local onde pessoas “indesejadas” na sociedade eram trancafiadas. A ideia inicial era cuidar e tratar de pessoas com doenças mentais, mas o objetivo foi desvirtuado, sendo aprisionados gays, negros, prostitutas e alcoólatras.

 

Não obstante, não era incomum que casos ainda mais absurdos acontecessem. Em um relato, uma garota que ficou grávida, e por isso era um inconveniente para os pais, foi deixada no local com a promessa de “aprender uma lição” e que voltariam em pouco tempo para buscá-la. Nunca mais voltaram…  

Os internos eram forçados a beber a própria urina ou esgoto, já que não tinham acesso a água.

Não existia um sistema justo ou clínico para emitir ordens de internação. Os poderosos da época tinham influência sobre o local. Coronéis, delegados, maridos insatisfeitos e furiosos por traições da esposa, etc, todos estavam “aptos” a jogar alguém ali dentro. Em um dos relatos do livro, o motivo pelo qual levou a internação de uma jovem de 23 anos, em seus registros, era porque estava “triste”. Não havia qualquer critério médico ou clínico, as justificativas beiravam o absurdo.

 

Jornalista Daniela Arbex. Foto: Divulgação

Os internos dormiam juntos, sem cama, em amplas salas, como se fossem bichos. O chão era coberto por capim e eram forçados a acordar às 5 da manhã. Após acordarem, eram jogados no pátio central onde ficavam até as 19h – diariamente, domingo a domingo. Barbacena é conhecida por ser uma cidade fria, e é horrível pensar o que estas pessoas passaram, nuas, no meio do pátio aguardando o cair da noite para se recolherem.

 

A alimentação era considerada absurda. Muitos ficaram severamente desnutridos e centenas desenvolviam doenças. Vários pacientes passavam fome constantemente. A água não era entendida como um elemento básico da vida humana. Os internos bebiam, muitas vezes, a própria urina ou esgoto (já que existiam fossas no pátio central), além de comerem ratos e pombos, desesperados por alguma fonte de alimento.


Existem relatos de que muitas mulheres foram estupradas por funcionários. O fato de que muitas permaneciam sem roupa, dava ao local um ar de promiscuidade, que estimulava barbáries como esta. Crianças não eram poupadas, e também dormiam nuas, junto com todos, nestas condições horríveis.


Mesmo não tendo uma estrutura adequada, o local chegou a abrigar 5.000 “pacientes” ao mesmo tempo, mas a capacidade original do projeto dizia que seriam apenas 200 pessoas. Estima-se que 16 pessoas morriam, todos os dias, por não suportarem a superlotação. É algo inacreditável.

 

Venda de corpos gerava lucro

A autora do livro contou em entrevistas à imprensa, que foram encontrados registros de 1.853 corpos entre 1969 e 1980, vendidos para faculdades de medicina. Cerca de 17 universidades do Brasil compraram os corpos a um preço médio de 50 cruzeiros. Em dias atuais, algo em torno de R$ 600 mil foi negociado com os corpos vendidos.

 

Segundo a autora, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) recebeu 67 peças (forma como os corpos eram chamados). Com o passar do tempo, o negócio dos corpos passou a não ser mais tão vantajoso, já que muitas universidades haviam comprado e a demanda caiu. A instituição então passou a queimar os corpos no pátio, na frente dos internos ou derreter a musculatura usando ácidos, em busca de um novo comércio – a venda de ossos do esqueleto.


A extinta revista O Cruzeiro foi pioneira nas denúncias do que realmente ocorrida dentro da Colônia, e publicou em 1961 uma reportagem, assinada por José Franco e Luiz Alfredo. Ambos, foram entrevistados por Daniele Arbex e dão seus relatos no livro. Com a divulgação das barbáries e, mesmo com comoção do público, os atos monstruosos continuaram ocorrendo. Jânio Quadros, então Presidente da República à época, divulgou que ajudaria a Colônia, enviando dinheiro e que mudanças ocorreriam, mas nada ocorreu.

 

A autora ainda comenta que apenas em 1979, quando reformas psiquiátricas foram instauradas em Minas Gerais, a situação do local começou a mudar. Atualmente, a Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais mantém 160 pacientes da época. 

 

Se você leitor está se perguntando quantos pagaram na Justiça por essas monstruosidades, a resposta vai deixá-lo decepcionado. Segundo a autora, ninguém NUNCA foi punido por esse verdadeiro genocídio, que ficou desconhecido do grande público e apagado do conhecimento geral como se nunca houvera uma mancha cor de sangue na história do Brasil.

Fonte: Jornal Ciência

Tags:   Manicômio doentes Barbacena
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