
Os pais de Rian Brito não têm dúvidas: o chá de Ayahuasca, conhecido como Santo Daime, foi responsável por desencadear mudanças no filho que culminaram no afogamento do rapaz, neto de Chico Anysio, numa praia de Quissamã. A afirmação dos atores Nizo Neto e Brita Brazil encontra amparo no que a ciência já desvendou sobre os efeitos dessa mistura dessas ervas.
— Os efeitos desse chá incluem alterações perceptivas e delírios que podem desencadear quadros psiquiátricos graves em pessoas com predisposição. Se usada em ritual religioso, há pouco risco. Mesmo assim, pode desencadear doença permanente — alerta o psiquiatra Jorge Jaber, especialista em dependência química pela Universidade de Harvard e assessor da presidência da Associação Brasileira de Psiquiatria.

Para a maioria dos usuários, no entanto, não há prejuízo para a saúde a longo prazo. É o que afirma o professor de Psiquiatria da Unicamp Luis Fernando Tófoli, que desenvolve pesquisas com a Ayahuasca.
— No entanto, o uso do chá pode levar a transtornos mentais graves, como psicoses e transtornos bipolares, em pessoas com predisposição. São casos raros — diz Tófoli.
Nizo relatou que o filho mudou completamente após tomar o chá e passou a ter delírios. "Entrou num delírio que tinha uma missão e que, para isso, não podia comer. Chegou a pesar 45 kg. Existe o Rian antes e depois da Ayahuasca, apesar de ele ter tomado só quatro doses”, desabafou ao site "EGO”, acrescentando que três psiquiatras confirmaram que o uso do chá está na origem das mudanças no jovem.

Segundo Jaber, a substância, liberada pelo Conselho Nacional de Políticas Antidrogas (Conad) para uso em cerimônias religiosas, age alterando o pensamento em função de sua ação em neurotransmissores cerebrais. O Conad faz restrições ao uso por pacientes psiquiátricos graves.
— Por meio do chá, a pessoa entra em contato com uma entidade superior. Os efeitos alucinógenos explicariam cientificamente a divindade — diz Jaber.
A produção e o uso do chá, no entanto, não são fiscalizados por órgão governamental, como confirma a assessoria do Ministério da Justiça, ao qual está atrelado o Conad.
— Na prática, se observa que, graças à postura ética dos líderes religiosos que utilizam o chá, ele é servido para iniciantes em doses com concentração menor, permitindo o consumo mais intenso só aos seguidores fiéis à religião — afirma Jaber.

Mestre defende uso do chá
Um dos mestres do Centro Espírita Beneficente União do Vegetal — uma das maiores organizações religiosas brasileiras que usam o chá do Santo Daime —, Almir Nahas, de 58 anos, nega que a substância cause desorientação, se usada de maneira correta.
— Primeiro, quero deixar claro que não conheço essa seita do Rio. Na minha experiência de 34 anos com a União do Vegetal, nunca vi isso acontecer. O Daime, que nós chamamos de Vegetal, é o nosso sacramento. Como a hóstia para os católicos — explica Nahas, que frequenta o núcleo da Serra da Cantareira, em São Paulo.
Segundo o mestre, quem quiser fazer parte da seita deve ser levado por outra que já segue a religião. O candidato passará por uma entrevista com o diretor do núcleo.
— Perguntamos o objetivo da pessoa, o histórico das suas crenças e se ela passa por algum tratamento psicológico. Se ela tiver crise depressiva ou se tomar remédios controlados, pode não ser autorizada a entrar — afirma o mestre, que é formado em Comunicação Social.
A União do Vegetal tem 212 núcleos espalhados pelo Brasil e mais de 17 mil adeptos. Ela foi criada em 1961, pelo seringueiro Mestre Gabriel, que experimentou o chá da Ayahuasca na Floresta Amazônica.

Elke Maravilha fala sobre o Daime e faz ressalvas
Desde que a mãe de Rian Brito revelou ao EXTRA que o filho fazia uso do chá do Santo Daime nos rituais da sede carioca da seita Porta do Sol, dirigida pela atriz Leona Cavalli, na Zona Oeste do Rio, o assunto voltou ao centro do debate. Apesar de comparar a erva alucinógena ao ácido lisérgico, droga conhecida como LSD, Elke Maravilha, de 71 anos, afirma que toma o chá de Ayahuasca há cerca de cinco anos. Ela defende o uso, mas faz ressalvas.
— Sou a favor do uso para as pessoas que querem ampliar suas consciências. Ele causa alucinações e abre a sua mente. Se não for para autoconhecimento, é uma merda — resumiu Elke, acrescentando que já frequentou a filial da Porta do Sol em São Paulo. — O risco é você ficar consciente demais dos problemas da vida e acabar pirando — pondera.

Para a antiga defensora do uso da erva indígena Lucélia Santos, o assunto virou tabu. A atriz, que chegou a declarar na década de 80 que tomava a bebida, hoje não "fala mais sobre o assunto”.

O EXTRA voltou a procurar Leona, mas atriz limitou-se a dizer que vai "resolver o problema (com Brita, mãe de Rian) na Justiça”. O site Porta do Sol, que voltaria a funcionar ontem, conforme ela mesma afirmou na véspera, continuou fora do ar até o fechamento desta edição. A sede da seita, na Ilha de Guaratiba, na Zona Oeste, estava vazia na tarde de ontem. Uma funcionária informou que nenhum adepto apareceu e que não se lembra de Rian.
— É uma pena que ela continue oferecendo esse chá, e sem alertar os riscos — lamentou a mãe de Rian.